Como esperado, o Federal Reserve optou nesta quarta-feira por um novo corte suave (0,25 p.p.) na taxa de juros os Estados Unidos, mas a falta de dados mais recentes sobre atividade e econômica e o emprego – motivada pela paralisação do governo – gerou incertezas sobre os caminhos a seguir. Prova disso é que a decisão teve divergências para ambos os lados.
Embora permaneça entre os economistas a visão de que o banco central dos EUA terá motivos para repetir a dose na última reunião do ano, com outro corte de 25 pontos-base, o chairman Jerome Powell chamou a atenção na coletiva de imprensa para a decisão dividida e evitou cravar uma nova flexibilização em dezembro.
“O que não era esperado era a sinalização de que há grande divergência entre membros do FOMC sobre os rumos para de dezembro, e que a decisão está em aberto, o que provocou uma abertura na curva de juros e queda nas bolsas”, comentou Maria Irene Jordão, Estrategista Global da XP.
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O intervalo dos Fed Funds foi reduzido hoje para a banda entre 3,75% a 4,00%, mas o diretor Stephen Miran, indicado por Donald Trump, sugeriu uma redução de 0,50 p.p. enquanto o presidente do Fed de Kansas City, Jeffrey Schmid, votou pela manutenção das taxas.
Fim do QT
Os especialistas destacaram que a decisão de juros foi acompanhada do anúncio do fim em dezembro do QT, o aperto quantitativo (“quantitative tightening”), que reduz a oferta monetária. Segundo o comunicado os recursos de títulos vencidos passarão a ser reinvestidos em papéis de prazos mais curtos, diminuindo a duração média da carteira.
“Esse movimento era esperado, com alguns sinais de pressão de liquidez nos mercados surgindo ao longo do mês. E o próprio Powell realizou discurso no último dia 14 em que deu indícios de que o fim do QT estava próximo, afirmando que o plano sempre foi encerrar o QT quando as reservas estivessem em um nível que eles julgavam satisfatório”, explicou André Valério, economista sênior do Inter.
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Gustavo Cruz, estrategista-chefe do RB Investimentos, lembrou que o balanço do Fed, que chegou a quase US$ 9 trilhões em 2022, está sendo normalizado desde 2023 e deve se estabilizar na casa dos US$ 6 trilhões, ainda acima do nível pré-pandemia, que girava em torno de US$ 4 trilhões.
“Esse movimento levanta uma questão para 2026: se o Fed pode voltar a expandir seu balanço em um cenário de inflação ainda elevada e mercado de trabalho lateralizado. Caso isso ocorra, o dólar pode se enfraquecer ainda mais frente a outras moedas no próximo ano. Por ora, o sinal é de pausa na redução do balanço, o que tende a dar suporte aos ativos de risco globais no curto prazo”, afirmou.
Para Ariane Benedito, economista-chefe do PicPay, “a medida marca o fim do ciclo de enxugamento de liquidez iniciado em 2022, e é vista como um sinal de flexibilização adicional, em linha com a percepção de que o sistema financeiro deve operar em condições monetárias menos restritivas”.
Divisão de votos
Sobre a divisão de votos, embora os economistas tenham atribuído essa divisão à incerteza gerada por uma visão mais clara da economia em meio ao shutdown do governo, também há leitura de que as diferentes opiniões podem representar um ajuste natural antes da troca da equipe.
“Já houve dissenso na decisão de outubro, com Miran votando pela segunda vez por um corte mais agressivo, de 50 bps, e Schmid agora votando por manutenção dos juros. Para dezembro, a divisão no comitê deve se aprofundar considerando as últimas declarações de Powell, e teremos divulgação do SEP”, disse Maria Irene Jordão, da XP.
“A divisão interna reforça que o FOMC se encontra em fase de transição, ponderando entre o controle inflacionário e a necessidade de preservar a atividade”, disse a economista-chefe do PicPay.
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“Vemos uma nova dissidência no comitê, com um membro votando para não cortar a taxa de juros nessa reunião, enquanto outro votou para cortar 50 pontos base. Dentro do esperado, dada a divisão que ficou clara nas projeções divulgadas em setembro”, argumentou Valério, do Inter.
Emprego perdendo força. Será?
Sobre a decisão de juros, a estrategista da XP destacou como relevante os comentários de Powell acerca do mercado de trabalho, para o qual não há novos dados oficiais por conta do shutdown , que se aproxima da marca de 30 dias.
“Diante dos anúncios de layoffs nos últimos dias, havia uma certa expectativa no mercado de que o tom dovish fosse mantido, o que foi frustrado com declarações acerca de resiliência da atividade econômica e que o mercado de trabalho ‘não está se enfraquecendo rapidamente’, como era sugerido após as revisões negativas do payroll”, disse Jordão.
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Ela citou uma fala de Powell avaliando que o enfraquecimento do mercado de trabalho é uma função do declínio da força de trabalho — cíclico e atribuível à queda na imigração — e redução na demanda por mão de obra, e que esses processos concomitantes se moderaram após o choque do início do ano, com estabilidade sugerida pelos últimos dados de abertura de vagas.
A estrategista destacou ainda que investimentos em inteligência artificial foram outra questão bastante presente na coletiva de imprensa. “Powell avalia que o enfraquecimento recente do mercado de trabalho ainda não pode ser atribuível a substituição por IA, mas pode haver um ajuste na criação de vagas, e que o movimento recentes não pode ser comparável à bolha das ponto com por conta da lucratividade das empresas envolvidas”, disse.
Marianna Costa, economista-chefe da Mirae Asset Brasil, também destacou que a redução de juros ocorreu em um contexto de visibilidade limitada sobre a economia norte-americana em razão da paralisação do governo, que suspendeu a divulgação de dados oficiais, exceto o índice de preços ao consumidor (CPI).
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Ela disse que o comunicado do Fed reconheceu o aumento da incerteza econômica e revisou a avaliação sobre a atividade ao mencionar que “‘os indicadores disponíveis sugerem que a economia tem se expandido em ritmo moderado”. Além disso, foi lembrado que a criação de empregos desacelerou e que a taxa de desemprego subiu levemente, embora siga baixa.
Por fim, o texto também reforça que os riscos de queda para o emprego aumentaram nos últimos meses, sinalizando maior preocupação com o mercado de trabalho, disse a economista.
“Em entrevista, o presidente do Fed, Jerome Powell, afirmou que o crescimento econômico tem se mostrado um pouco mais firme do que o esperado. Para Powell, os dados disponíveis antes do shutdown indicam que o crescimento da atividade econômica pode estar em uma trajetória ligeiramente mais sólida do que o previsto, refletindo principalmente a força dos gastos do consumidor”, completou Mariana.
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Para Valério, “os dados paralelos de mercado de trabalho indicam continuidade da perda de força do emprego na margem, enquanto o dado de inflação veio abaixo do esperado. Ainda assim, vemos uma nova dissidência no comitê”.
Ariane, do PicPay, comentou que o comunicado do FOMC reconhece que a atividade econômica segue em expansão moderada, enquanto a taxa de desemprego, embora ainda baixa, apresentou leve alta. A inflação, por sua vez, voltou a subir em relação ao início de 2025, permanecendo acima da meta de 2%, mas sem novos sinais de aceleração.
“Nesse contexto, o FOMC destacou que os riscos à meta dupla de máximo emprego e estabilidade de preços tornaram-se mais equilibrados, mas que os riscos negativos para o emprego aumentaram nos últimos meses, justificando a mudança de postura monetária”, destacou.
Fonte: Infomoney.com